Olá queridos... sejam bem-vindos!
Devido a viagens e muito trabalho extra, estive um tempo sem escrever
para este blog, mas hoje, estamos de volta para continuação de nossas postagens
sobre os estágios do abuso sexual na infância. Abordaremos o terceiro dos quatro estágios. Os estágios
anteriores podem ser encontrados nas postagens abaixo desta.
Estágio: O abuso
Estamos nos
referindo ao abuso sexual propriamente dito, seja por interação física ou
psicológica. Segundo Allender (2008, p.122) o abuso pode acontecer de variadas maneiras e
vir de tantas fontes distintas que chega a ser perigoso falar sobre ele sem algumas
precauções.
É importante
lembrar que existe uma graduação clara quanto à severidade e intensidade do
dano causado pelo abuso. Abaixo, algumas considerações sobre este estágio.
1- Quanto à natureza
do relacionamento, pode ser variado, mas existe aqueles que são mais
específicos e principalmente quanto ao grau de proximidade (pai versus
vizinho);
2- Quanto ao grau
de intimidade anterior ao abuso, isto desempenha um papel importante na
extensão do dano;
3- Quanto ao grau
com que a violência física ou psicológica foi usada ou serviu de ameaça também
influencia os resultados de curto e longo prazo.
As considerações acima, são de Allender (2008, p.123), mas como especialista em inteligência emocional, adiciono a seguinte observação:
É importante lembrar que, além das considerações acima apresentadas por Allender, o fator interpretativo e significativo dado aos abusos pela vítima, podem potencializar o sofrimento e as marcas deixadas. Cada ser humano é único e tem suas próprias possibilidades interpretativas e dão significado diferentes para o abuso que sofreu, por exemplo: uma pessoa pode ter sofrido o abuso sexual psicológico, mas o seu aprisionamento pode ser maior e mais profundo do que outra criança que sofreu o abuso psicológico e físico. Assim, dizer que um abuso é mais devastador que o outro, apenas pela verificação dos fatos, é perigoso e até danoso, pois, sem querer, a vítima pode entender que a sua dor está sendo atenuada ou potencializada.
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Não fácil chegar a um resultado que determine a gravidade do dano. Geralmente,
“o abuso sexual acontece num contexto de vazio, confusão e solidão, um contexto
que prepara a vítima para um desconcertante relacionamento de traição,
ambivalência e impotência à medida que o adulto passa de uma fase à outra do
processo”. Allender (2008, p. 124)
A traição envolve
mais coisas do que a sabotagem da relação. É também intensamente pessoal e
física. Este é um conceito difícil de entender e de aceitar, especialmente por
aqueles que sofreram o abuso.
Devemos pensar na
complexidade que é falar sobre a questão do despertamento sexual que o abuso
físico traz. Afinal, o corpo humano é capacitado para sentir prazer, mas este
tipo de despertamento é pervertido pelo abuso sexual. É preciso lembrar que,
gostando ou não, o abuso traz consigo um despertar de prazer na vítima... um
prazer legítimo, dentro de um contexto que faz com que a apreciação seja um
veneno perigoso.
Allender (2008, p. 125) conta a
história de uma jovenzinha de 13 anos que foi abusada por uma autoridade
eclesiástica que acompanhava a família dela desde que ela era apenas uma
criancinha.
No momento em que o abuso sexual
propriamente dito se iniciou, ela se sentiu extremamente ambivalente quanto ao
relacionamento. Por um lado, ela apreciava a proximidade e a intimidade e, por
outro, sentia-se assustada e culpada. Sentiu-se despertada sexualmente por seu
toque, mas, ao mesmo tempo, usada e vulgar. Seu compromisso em acabar com
aquele relacionamento abusivo parecia forte o suficiente nos momentos em que
estava sozinha; ao sentir o toque suava das mãos dele, a determinação se
desvanecia. Ela se sentia fraca e derrotada: sentia-se uma traidora todas as
vezes que se encontravam.
É difícil descrever a experiência
paradoxal da ambivalência. Ter uma emoção forte (terror) e um sentimento
igualmente poderoso (desejo) parece algo inconcebível. Adicione-se a confusão à
contradição. Como alguém pode odiar e desejar a mesma pessoa? Como se pode
apreciar e odiar o prazer sexual vivido durante o abuso? A confluência de
correntes emocionais tão antagônicas faz com que a vítima se sinta
enfraquecida, louca e envergonhada. (Allender, 2008, p. 125)
Por não controlar
a resposta psicológica ao prazer, e a incapacidade de interromper o abuso,
muitas crianças sentem-se traídas pelo seu próprio corpo. É até desgostoso
escrever isto, mas despertamento sensual, prazer sexual e até mesmo o orgasmo
podem acontecer quando uma criança sofre abuso, mesmo quando há um forte desejo
de evitar a sensação.
O despertamento
sexual não será vivenciado em todas as situações em que houver um abuso. Em
alguns casos, o temor vai bloquear o despertamento; em outros casos, a dor
física é tão severa que o prazer é impossível.
Claro que, até
pode ser que não ocorra nenhum despertamento consciente, pois a vítima pode
dissociar seu pensamentos e sentimentos de sua experiência física. Conforme
Allender, (2008, p.126, 127) “Este estado é similar ao que se chama de experiência extracorpórea
ou transe hipnótico auto-induzido... Quando a informação é por demais
opressora, um fusível queima, impedindo que todo o sistema elétrico se
danifique... Não é incomum que a vítima bloqueie totalmente seus sentimentos de
ódio...”
Segundo Allender (2008, p. 127), existe uma combinação de impotência, traição e ambivalência que contribui e
constitui para o estabelecimento de avassaladoras emoções traumáticas.
A impotência
revela uma incapacidade da vítima em afastar-se do agressor ou, ainda a
concorrência interna onde as emoções se tornam impossíveis de serem
coordenadas. As vítimas, muitas vezes, preferem não ter qualquer tipo de
sentimento.
Na ambivalência
Sexual, é importante destacar que nem todos os abusos do estágio 3 implicam
violação física. O abuso sexual propriamente dito inclui interações psicológicas
que são extremamente danosas. Um exemplo de interação psicológica, Allender (2008, p. 127),
cita a história de um treinador que depois de levar o seu aluno a executar um
exercício complexo, frequentemente tocava a nuca dele, gentilmente apertava
seus ombros ou fazia comentários sobre a graciosidade e força de seu corpo em
desenvolvimento.
E uma coisa
intrigante pela qual Allender, nos lembra, diz respeito ao ódio da traição e o
pânico oriundo da possibilidade de perda do relacionamento com o abusador e familiares
da vítima e isto, cria ambivalência na vítima.
Como é possível
perceber, o abuso sexual propriamente dito, dispara um emaranhado de emoções
que, em
muitos
casos, o despertamento sexual fará parte da experiência do abuso sexual.
Ambivalência - a mistura de ódio e desejo, prazer e vergonha - ativa um forte
desejo de dissociar e separar as duas emoções opostas, de forma que é criada na
alma uma grande fenda entre o prazer e o ódio, onde, freqüentemente, os dois
componentes são apagados da memória. (Allender, 2008, p. 128)
Todos os artigos aqui postados são de
responsabilidade e *autoria de:
Rai Godoy
- Especialista em Sexualidade, Inteligência Emocional e Analista de Perfil
Comportamental - Life Coach - Conselheira Profissional – Hipnoterapeuta
(Instituto Versate e ACT Institute) - Membro da ABRASEX, SBRASH, SBIE e SLAC. *com
algumas exceções que serão devidamente citadas
Referência:
Allender,
Dan B., Lágrimas Secretas: Cura para vítimas de abuso sexual na infância. São
Paulo: Mundo Cristão, 1999 – 3ª reimpressão 2008